Cláudia Paiva Silva

Saturday, March 23, 2024

Dor, fé e devoção, para as massas
March 23, 20240 Comments

 


Arrancado aos pedaços, com boas doses de música ambiente dançante, numa discoteca privada apenas aos presentes. Precedido com uma introdução da australiana-fixada em Brighton, no sul de Inglaterra, Suzie Stapleton, mostrando, uma vez mais, o poder da guitarra no feminino. Cortinas para baixo, em escassos minutos de atraso. 

Para quem sempre se acostumou a estar sentada, confortavelmente, nos balcões laterais, vendo tudo por um canudo, ou tendo de ampliar ecrãs de telemóvel, aquelas 3 horas e meia em pé, bem mais perto do palco do que inicialmente tinha consciência, foram surpreendentes - e esta palavra não serve, nem justifica o sentimento. Desde o momento em que chego à fila, já de si longa para um "Golden Circle" que, afinal, era tudo menos isso, até que arredei pé do local onde me fixei, tudo me parece, ainda, ao dia de hoje, simplesmente, surreal. 

O M de Memento Mori, ou do que quisermos inventar nas nossas teorias da conspiração perversas, enche o palco, relativamente mais pequeno ao que certamente, costuma passar por outras cidades. Mais baixo, de acordo com a plateia multinacional, o que rareia a vista, nomeadamente quando os braços se elevam para gravar tudo o que acontece. 
Primeiros acordes, numa banda que, passados tantos anos, após um ALIVE que não era para ela, retorna a Portugal. E se me é permitido, que estava, honestamente, "receosa" do que poderia de nós receber.





Sendo que o jornalismo se quer isento, aviso que este texto, é um artigo de opinião. De isenção pouco terá. Sim, poderá ser um texto enviesado para muitos, mas quem esteve onde eu estive desta vez, e não nos tais balcões, onde, há quem diga, pouca emoção se fez sentir, entenderá que, apesar do cansaço físico, óbvio e visível, as vozes estiveram impecáveis, a força e energia de entrega também, pese os já tradicionais problemas de som de um "pavilhão atlântico" que nunca os conseguiu superar. Nem, alguma vez, irá.

O M estava com caveiras, vermelho. Óbvios registos do tema que deu início à noite incrível que Depeche Mode trouxe a Lisboa. E não, não revisito a lista de canções tocadas, simplesmente porque pouco me importou. Estava a vê-los e a "tê-los" a escassos metros. Tudo o resto deixa de ter importância, ou fazer grande sentido.

Pelo fim. Diz, quem foi, diz quem foi a todos os concertos da banda em Portugal (e uns tantos lá fora), que, a noite de 19 de março, só foi comparável com a Devotional Tour, quando a banda inglesa passou por Alvalade a 11 de julho de 1993. Não sei, mas tenho de acreditar. Só comecei a seguir o percurso, na altura, atribulado, a partir de 1997.

Mas "há dias", tudo estava perfeito. Tudo foi perfeito. Nomeadamente a energia do público. E como energia gera mais energia, o que se dá, recebe-se em troca a triplicar. E esse, foi o quebra gelo para uns senhores, que no auge da sua idade, experiência e respeito que lhes é devido, conseguem transformar a dor, em fé e devoção para uma massa humana, que encheu até ao máximo o espaço escolhido. Foi esse o momento em que o receio de entrar em diálogo, ainda que escasso, com a plateia, se dissipasse. A partir dessa altura, dar e receber, de lado a lado, foram totais.

Não posso refletir no que lhes passaria pela cabeça. Poderia entender que o físico, de todos os que lá estavam, já pesa (sim, nos meus 40 anos, não posso esperar sentir o corpinho como quando tinha os meus 23 anos). Mas posso garantir que a experiência foi orgásmica. Passo a explicar: aquele instante em que se atinge o êxtase, em que se chora, em que não sabemos em que terra estamos. Para mim foi assim, mas compreendi que para tantos outros, foi similar. 
Uma vez mais, é uma opinião pessoal. Não é coletiva. 

Desde a tímida homenagem a Fletcher, aquela criatura tão querida por todos, mas cujo desaparecimento fez crescer uma proximidade entre Martin e David, como há muito não se conhecia, nem via. Estaria ele presente? Certamente que sim. Fiquei no lado onde o "clapping hand man" costumava estar. Quem dera que ele lá continuasse, para dizer adeus a todos, volta e meia, e tocar num tecla apenas, outra meia volta depois. Mas a sua falta, acaba por ser uma resposta ao deus no qual Martin tanto acredita. Tornou os amigos coesos. As famílias mais próximas. Momento Mori - lembra-te que vais morrer. E daqui, não levas nada a não ser estes instantes. 

A emoção pode ter sido resultante, também, aos temas que mais me tocam, aqueles que mexem claramente com a minha psique, que me fizeram a mulher em que hoje me tornei, e que me garantem a sanidade em vários momentos. E, claro, a um trabalho de braços incrível e essencial para quem lá vai, e sabe AO QUE vai, e fica para os encores. Não há forma de explicar a sensação. Enquanto vejo Dave a obrigar-nos a um exercício físico que sabemos bem que temos de fazer, e me vejo, aliás, NOS vejo, a todos, à arena em uníssono de coros e braços levantados, não há hipótese. É um momento de sacramento, em perfeita sincronia, como quem vai à missa a comer o corpo de Cristo. É um momento de dor, é um momento de devoção. Pura precisão. 

Foram duas horas e 15 minutos em palco, mais tempo do que nos últimos concertos. Foram mais de 100 espetáculos até agora concretizados, desde o início da digressão. E acho que, qualquer um de nós, mesmo "mortos", ainda assim, bem vivos, de dores e cansaço, ficaríamos, à vontade para mais duas horas. Para mais uma vida inteira ao serviço dos mestres, tímidos nas conversas, proprietários na música.

A cara de David, bem no final do espetáculo disse tudo, segundos antes de sair, definitivamente, do palco. Quem esteve sabe também. E era pura alegria. Não há outra palavra que sirva. Até mesmo, digo, seria desnecessária. 

Agora? É apreciar o silêncio, com a alma cheia. 




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Sunday, March 17, 2024

As Mulheres de Maria Lamas, as mulheres de Portugal
March 17, 20240 Comments

Fizesse chuva ou sol, numa época em que as mulheres eram tidas como boas donas de casa, senhoras de família, boas esposas e mães, recatadas, com profissões, se as tivessem, femininas: enfermeiras, professoras, havia um Portugal inteiro onde a pobreza, obrigava, tantas outras, a trabalharem como os (seus) homens. Carregando fardos de palha, trabalhando nas minas, colhendo o trabalho dos campos, nas lavouras, mais além do parco trabalho em casas de pedra, onde os colchões de palha substituíam os lençóis, as camas em madeira de carvalho, mas que estavam sempre, imaculadamente limpas, apesar da escassez gritante de ordenados que permitissem uma mesa com mais pão, mais carne, alimentando as, não raras vezes, numerosas famílias. 

Maria Lamas (1893-1983) fotografou tudo isso e relatou-o também, na obra Mulheres do meu País (trabalho concretizado entre 1947 e 1950), cuja publicação só foi permitia em capítulos individuais. Embora à época muitas outras mulheres-senhoras, ironicamente as mais privilegiadas, não se identificassem o que estava redigido, não houve impedimento para que Maria Lamas, escritora, professora, investigadora, jornalista, não passasse da revista Modas & Bordados, anos antes, para o Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, de quem se tornou presidente da Direção, em 1945. 


Busto de Maria Lamas.
 Gesso esculpido, em 1929, por Júlio de Sousa.

Poderíamos escrever toda uma tese da mulher feminista que Maria Lamas era e do que representou para os direitos entre mulheres e homens durante o Estado Novo, mas a verdade é que, os seus livros há muito que estão "esgotados", as suas exposições fotográficas são "inexistentes", e a sua obra, permanece uma incógnita para quase todo um país, Portugal, bem certo. 





A par com Artur Pastor, entre tantos outros, Maria Lamas, conseguiu, contudo, nas imagens agora expostas na Fundação Calouste Gulbenkian, até 28 de maio, em Lisboa, captar o olhar da mulher portuguesa, a tal que não baixava os braços e não se limitava aos bordados e missas. Esta exposição, um pequeno exemplo do seu trabalho, tem a curadoria de Jorge Calado, que, aos longo de anos, se tornou especialista na escolha das suas fiéis imagens. Ao todo, foram selecionadas 67 fotografias, de pequena dimensão, e raras ampliações. Mas a exposição também conta com pedaços de vida da autora, através de cadernos, anotações, livros. 

Aquela Maria Lamas, que foi presa pela PIDE em 1949, 1951 e 1953, exilada em Paris entre 1962 e 1969, principalmente por um contínuo e manifesto discurso anti-regime, resultando numa contínua e manifesta perseguição pela polícia política, tem agora, aqui, hoje, a oportunidade de se reapresentar aos portugueses, e de mostrar o papel que todas e todos temos, quando lutamos pelo bem comum.



EXPOSIÇÃO AS MULHERES DE MARIA LAMAS 

FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN COM ENTRADA LIVRE

ATÉ 28 MAIO 2024

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Era uma vez, a Mulher e o seu núcleo de prazer
March 17, 20240 Comments

 O texto que se segue foi primeiramente publicado na REVISTA RUA a 4 de março de 2024.


Tema fraturante, mas cada vez mais necessário num mundo politicamente correto e, simultaneamente, tão sem amarras, “O Sexo das Mulheres” pode ser entendido como um manifesto, ou, livro de crónicas. 

Contudo, na realidade, o livro da autora Anne Akrich, é um murro na mesa, na evolução do feminismo.





Anne Akrich, francesa, mas criada no Taiti, sabe falar de sexo. E sabe falar de sexo, sem culpas, no feminino. Ou então, sabe falar da culpa que as mulheres sentem quando nele falam, pensam, ou, o fazem.

Porque o livro “O Sexo das Mulheres” (edição Quetzal) não é um livro de educação sexual. Ou melhor, também o pode ser. E porque nos aproximamos rapidamente de dia 8 de março, consagrado e exclusivo para as Mulheres, porque não colocar o dedo na ferida? Mais ainda quando as eleições nacionais irão, certamente, eclipsar mais uma data anual, igual a tantas outras, mas cuja importância não passa de distribuição de flores e pouco mais.

Os números não enganam, e continua a haver uma predominância de casos de violência contra as mulheres, em todo o mundo. Incluindo a violência sexual que já não passa apenas pela violação, ou pela violência de atos sexuais não consentidos.




No livro, contudo, Anne aborda outros temas que tocam profundamente a imensidão da psique feminina. Nomeadamente a culpa que muitas mulheres ainda sentem – sim, em países desenvolvidos, modernos, “open-minded” e onde o “me too” carrega todo um peso. A culpa, maioritariamente derivada de um sistema patriarcal, bem enraizado em países como Portugal, por exemplo, onde até há poucas décadas, a mulher se queria “domesticável” e, “disponível” para as vontades masculinas apenas.

Mas e quando é a vez delas? Num sistema social bem definido, onde o feminismo tem lugar, não haveria espaço sequer para qualquer dúvida. Homens e Mulheres têm o mesmo direito ao prazer, a procurar formas de terem prazer. Mas, sabemos que não é tanto assim, embora, as novas gerações insistam em importar conceitos internacionais que desmistifiquem as ocorrências. Mas será que podemos tratar o sexo da mesma forma em Portugal, como na França, como um país nórdico, africano ou asiático? Talvez não.

O prazer no masculino resume-se rapidamente a uma “ação” para o exterior. Já no que toca ao prazer feminino, há que estimular cerca de 10 mil terminações nervosas. Não pode ser uma coisa rápida e “(in)dolor”.

Ainda assim, palavras como empoderamento feminino, sororidade, ou as mais recentes “estou a criar um/a feminista”, não mais servem do que achas para uma fogueira a céu aberto, com emissões de CO2 por todo o lado. Numa época na qual as políticas parecem convergir para uma “direita” fatual e eficiente, as reivindicações, as questões, as culpas femininas, provocam o caos e o medo no masculino. Mais, todos os tipos de manifestações são já vistos, pelas próprias mulheres como um exagero, uma afronta. Quase que é necessário voltar ao tempo em que a mulher deve ser recatada, e estar pacificamente no seu devido lugar, sem fazer muito barulho.

Numa das entradas mais cómicas, e, no entanto, tão verdadeiras, do livro, Anne descreve: “O sexo feminino é o órgão mais inteligente do corpo humano. É provavelmente isso o que mete medo. Basta pensar que nos filmes de Hollywood há muitos monstros que são vaginas. Predador, Alien, o deus dos Aracnídeos, o meu preferido continua a ser o Cérebro comedor de pensamentos de Soldados do Universo, uma vulva gigantesca ataviada com oito olhos. Penso num homem sozinho diante da folha de desenho, a moer a cabeça para imaginar o aspeto de um monstro aterrador, que, inconscientemente, esboça os contornos de uma vagina (…). Uma vagina pessoal! Há lá coisa mais aterradora do que uma vagina!”

Alien - Facehugger

Resta a questão, será que este medo, enraizado nos homens, talvez num complexo de Édipo, não estará igualmente presente em quase todas as mulheres? Uma memória no ADN desde a época de Eva e Adão, onde, claro, a maçã caiu nas mãos da Mulher, contaminando toda a futura Humanidade.

Mais a mais, não é mulher a principal culpada pelo seu desgoverno sexual? Se ainda hoje se escuta que, certamente, se colocam a jeito, como sair da espiral de eterna culpabilização pelos instintos mais básicos, carnais e humanos que existem?

TIZIANO, Vecellio di Gregorio (?-1576). Adão e Eva (1550). Museu Nacional del Prado, Espanha

Assim, “O Sexo das Mulheres”, desbrava vários territórios, entre os quais também se incluem filhos, maridos, companheiros, aventuras, desventuras, abuso sexual, abuso de poder, o que nos é transmitido de geração em geração. Mas não, não ensina o futuro, não o prevê sequer. Apenas reflete o resultado de, talvez, milénios de dúvidas e poucas respostas.



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Monday, November 06, 2023

Todas as palavras do mundo
November 06, 20230 Comments

Todas as palavras do mundo.

Nem todas são secas.

Algumas palavras engasgam-nos. Parecem argila que se mistura com água e aumenta o volume. Os poros enchem rapidamente e não deixam mais nada entrar. Nem sair.

Existem palavras assim. Que ficam presas por serem ditas. Que anseiam serem ditas. Deitadas para fora e simplesmente não conseguem. Porque estão ali. Naquele limbo da tríade coração-garganta-boca.

Impossíveis de se revelarem.

Existem várias palavras que te poderia dizer. Mas na verdade, de todas as mais difíceis já te as disse todas. E mesmo assim acho que são poucas. Possivelmente são poucas. Existem tantos dialetos, que as minhas palavras são escassas, nulas até. E batidas, repetidas até à exaustão, iguais a tantas e a todas as outras, proferidas por todas as pessoas, em toda a parte.

E, como tal, sem qualquer efeito. Não parecem reais. Não parecem dignas sequer. Não diria impuras, mas sim, banais.

A banalidade que achava não ter, escondida em palavras banais, não-secas, mas argilosas. Que se alimentam de outras similares. 

O meu "dom" da palavra. Oral, escrita, simplesmente e ordinariamente transformado em nada. Sob as sombras de tantos outros pseudo dons que achamos que temos.

As palavras não são secas. Porque são argila que se molha. 




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Sunday, November 05, 2023

verdes de outono
November 05, 20231 Comments

 



Chega aquela época do ano. Mas as cores, deus... as cores. Aqueles tons ainda quentes, mas macerados pela queima do sol, e arrancados pelas primeiras chuvas, turvos pelas primeiras rajadas de vento mais frio. 

Os verdes de outono, os castanhos e vermelhos, as cores que anunciam morte, queda, quebra e, ao mesmo tempo, renascimento. Ninguém hoje está preparado para este sentimento de mudança. Ninguém quer saber, com a pressa dos dias. Não se pára para perceber e olhar e estar vivo para compreender a alteração, a metamorfose da natureza. 

Fala-se em alterações climáticas, mas quando temos a normalidade, não queremos olhar - dá-nos mais jeito o diferente, o anti-normal, ou não será antes, o novo normal?

O outono tem esse jeito doce de pôr o fim a um ciclo. Como aqueles romances de verão que são luz e fogo enquanto o vento suão espalha incêndios, e que sabemos que têm de terminar logo que caia a primeira folha. Rezamos para que não aconteça, mas é sempre inevitável. O outono pode demorar a aparecer, pode aparecer mais manso na sua chegada mas vem sempre.

O outono dos livros, dos cafés quentes ao som de chuva, das primeiras mantas e do aconchego caseiro. Dos passeios nos parques onde as árvores nos beijam com as tais cores, as tais folhagens. Aquele que antecipa o inverno da desolação, branco ou negro tingido, frio e implacável.

Esperamos pelo melhor, mas temos de nos fazer à respiração profunda, mais húmida, a cheirar a chuva e molhado. A vida. 



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Wednesday, March 29, 2023

Páscoa Doce com Pintarolas. Os botões de chocolate da Regina
March 29, 20230 Comments

Regressando em grande. Ou em formato mais "doce". 

A marca (filha) da Imperial (“dona” da Regina e Pantagruel, entre outras), apresenta-se ao serviço da Quaresma com uma nova gama. As tabletes de chocolate Pintarolas chegaram mesmo a tempo de fazerem esta Páscoa mais doce. E pensando que o que é doce acaba por enjoar, um cubinho por dia, não sabe o bem que lhe faz. Além do delicioso sabor tão característico do chocolate de leite da marca mãe, na Pintarolas em tablete, claro que temos os botõezinhos coloridos, para aquele crocante ainda mais achocolatado. Delicioso.

Como seria de esperar, existem também receitas onde as várias marcas Imperial se juntam. Desta vez calha a Pantagruel fazer as honras, junto à Pintarolas. Entre ovos de Páscoa recheados, a bolos de chocolate, imaginação não falta. Basta seguir as redes sociais das duas marcas e ver quais as novidades gostosas.

A Pintarolas foi primeiramente apresentada ao mercado nacional no final dos anos 70. Quem cresceu na década de 80 e 90, foi assistindo à sua evolução, que se bateu sempre junto à chegada de produtos estrangeiros. Hoje em dia, é com “grande pinta” que desbrava novos mercados internacionais, pautando pela qualidade e reputação a nível Europeu.

Será sempre um prazer aos sentidos do paladar, continuar a ver a Pintarolas crescer.



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Friday, November 18, 2022

A Hipocrisia dos Direitos Humanos
November 18, 20220 Comments



Falamos de Fado, Futebol e Fátima (ou qualquer forma de religiosidade) e parece que o mundo desaba. 

Contudo, parece que à luz do conhecimento atual, e por atual entenda-se, do último ano (porque o ano e meio de pandemia era como se o tempo tivesse parado e até tivéssemos regredido cultural e socialmente), começámos a ganhar um entendimento generalizado do que são os Direitos Humanos. 

Parece-me inconcebível que só agora, só nesta semana, na qual voltamos a ter certezas sobre aquilo que a maioria dos agentes das nossas forças de autoridade e, suposta, proteção, pensa sobre grande parte da população que habita no país, portugueses ou não, é que nos lembramos que em alguns países do Médio Oriente, independentemente de serem mais ricos ou mais pobres, não são assegurados os Direitos mais básicos a que todos deveríamos ter acesso ou direito.

Afirmar que "em nome do futebol" podemos fechar os olhos, como se fosse uma justificação, ou que, "é lá da cultura "deles"", é estarmos a compactuar com a situação. É estarmos a aplaudir, a aceitar e, pior, a normalizar a situação. 

Atitudes destas, afirmações como a de um Presidente da República, claro que irão repercutir em movimentos xenófobos, além de apenas refletirem uma profunda falta de respeito (e eventualmente de conhecimento e educação) perante determinada comunidade ou país. Faço-me entender: no Irão, a sociedade é, na sua larga maioria, contra o regime atual, contudo, é fácil encontrar aqui (no chamado "mundo ocidental") quem diga que o problema dos jovens, ou das jovens iranianas, não é um problema, mas sim uma questão cultural. Não é - a cultura de um país, que pode ser usada em prol político ou de restrição de, cá vamos nós, liberdade ou direitos humanos, não pode ser bode expiatório para justificar determinadas ações de um governo. É preciso conhecer bem os detalhes culturais e não generalizar. O que apenas se quer ou deseja, é que haja uma hipótese de escolha a essa imposição cultural governamental. 

Isto foi apenas um exemplo.

Perceber agora que aqueles países, construídos a partir do nada, no meio do nada, derivados de famílias e sultanatos, cuja forma de fazer negócios poderá ser colocada em causa, onde os direitos das mulheres continua a ser algo inexistente e, onde, claramente, as camadas mais pobres, são maltratadas, não tem aplicados os Direitos Humanos é apenas hipócrita. 

Referir aqui, hoje, em Portugal, que o Mundial de Futebol, realizado no Catar, onde por acaso já moram muitos portugueses (e possivelmente ainda irão morar mais nos próximos anos devido às possibilidades de emprego, que aqui, simplesmente não existem), é um exemplo de "horror", é hipócrita. 

Sabendo isso, a única coisa que podemos fazer, no caso, é não ver os jogos, é não continuar a contribuir para este negócio da bola, que parece servir como uma desculpa, devido à nossa própria cultura (desportiva?) - um bocadinho como acontece com a tourada, sabem? Ou com a questão das alterações climáticas - sabemos que temos de mudar os nossos hábitos de consumo, mas na verdade não iremos abandonar os nosso estilo de vida, porque, no fundo, não nos dá jeito. 

É tudo uma questão cultural, muito enraizada. Uma hipocrisia de 3 F's. 



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Thursday, November 03, 2022

Skincare a olhar a Natureza por Catarina Barbosa
November 03, 20220 Comments




De Lisboa para Vila Nova de Milfontes, Catarina Barbosa fez da sua sua carreira em Engenharia Química, uma forma de dedicação à formulação cosmética, a sua real paixão. O resultado, após uma série de processos necessários à instalação bem sólida da sua marca e garantindo os vários certificados, foi o lançamento da CATARINA BARBOSA skincare cujo primeiro produto a ser comercializado foi batizado de "Amália". Este óleo, rico em propriedades anti-inflamatórias e hidratantes, cujos extratos destacados passam por Edelweiss e Figo da Índia, apresenta, tal como os restantes produtos da linha de cuidados de pele, um nome tipicamente português, em homenagem clara às grandes mulheres que fizeram a diferença no nosso país. 

Ao mesmo tempo que a marca apresenta um leque muito completo para tratamento no feminino, apresenta também, como principal cuidado, o equilíbrio para com a Natureza, tentando utilizar o máximo de ingredientes de origem natural Falamos aqui de sementes, Bakuchiol (a atual alternativa ao retinol para peles mais sensíveis), colagénio e ceramidas vegetais, enzimas de papaia e ananás, aloé Vera, argilas várias, casca de salgueiro, que permite uma proteção aos raios Ultravioleta, aveia, entre tantos outros. Obviamente que uma maior conservação dos produtos finais necessita de restante composição química laboratorial, mas sempre respeitando a pele e, principalmente, respondendo às vastas solicitações de clientes cada vez mais preocupados com o meio ambiente. 


Na linha cosmética, além do óleo Amália, temos também o Sérum Maria, Essência Eunice, a Máscara Enzimática Florbela, óleo de limpeza Isabel, Bálsamo Simone e a Máscara Detox Carolina. Estes produtos são feitos com combinações naturais que se adaptam naturalmente à pele e às suas necessidades, correspondendo a hidratação, nutrição, proteção (da barreira cutânea), renovação celular e brilho natural, todos correspondendo a uma pele que se pretende saudável. 

Dando como exemplo a Máscara Detox Carolina, a sua combinação de água e carvão ativado, bem como com argila Rhassoul, Kaolin e Bentonite, garante propriedade de adsorção, reduzindo o tamanho dos poros, limpando a pele e removendo toxinas, sebo e poluição, promovendo a circulação cutânea. A presença de aloé Vera, garante uma ação calmante, após o efeito de esfoliação física. 
Já o óleo Amália, rico em salgueiro branco, apresenta desta forma uma esfoliação química, em alternativa ao ácido salicílico, essencial para uma renovação celular a um nível mais profundo da pele, criado em perfeita harmonia para maiores sensibilidades. 
Outro produto muito escolhido entre clientes, é o sérum Maria. A sua textura em gel é de rápida absorção, atuando como hidratante, reequilibrando o brilho, retendo a água na pele, sendo rico em ceramidas, glicose e frutose, que melhoram a barreira cutânea e prebioticos, que permitem uma proteção a patogénos indesejados e prejudiciais. 




7 produtos, múltiplas funções e objetivos, feito em Portugal, olhando para as pessoas, as suas necessidades diárias, com ingredientes que respeitam a sustentabilidade ambiental. 

Uma cosmética essencial nos dias que correm..


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Sunday, October 09, 2022

Terra de Lobos Marinhos, Pescadores e Sonhos de Mar
October 09, 20220 Comments


Câmara de Lobos, a apenas 9 Km do Funchal, é considerada uma freguesia dos subúrbios da cidade. Mas não se deixem iludir. A sua proximidade não faz com que esta zona da Madeira seja mais urbanizada, pese o crescente desenvolvimento da região, nem a designação "suburbana" a torna menos importante. Será sim, também, a sua tipicidade, as suas gentes, os seus bons e menos bons momentos e histórias que tornam esta povoação, única.


Descoberta por Gonçalves Zarco, na exploração a Oeste e Sul da Madeira, ganhou o nome pelo número de lobos marinhos que habitavam a pequena reentrância rochosa do mar, a qual dá origem à pequena baía. Facilmente habitável, pela serenidade da sua morfologia vulcânica, era terra de pesca e agricultura, que se mantém até aos dias de hoje. E se bem que as tradicionais bananeiras se tornassem parte da paisagem em terraços e fonte de rendimento, não restam dúvidas que serão sempre as pequenas ruas populares, agora mais propícias ao turismo, que captam a nossa atenção. 

Local visitado e pintado em aquarela por Churchill, que esteve na baía em 1950, Câmara de Lobos, também é terra de aromas e paladares. Diz-se que aqui se faz a melhor poncha da Madeira, a melhor espetada tradicional e claro, se comem as melhores lapas regadas com sumo de limão. 

Um regalo à nossa vista, além da visão e cheiro a Mar, passa também pelo contínuo trabalho feito pela freguesia. No lema em relação à sustentabilidade e ambiente, e educando transversalmente todas as gerações, apresentam-se de forma original trabalhos onde os resíduos tradicionais, como garrafas, caricas, antigas redes de pesca, plásticos vários, e até mesmo tecidos, são usados como elemento chave. O resultado é o engalanar das ruas, a chamada de atenção a um problema que começa a afetar todos. 

Apesar das suas possíveis vicissitudes, combatidas pela resiliência de um povo, esta terra antiga e histórica, com gentes de pele curtida e marcada pelo Sol, e muitos mais jovens com tanto para oferecer, é uma terra de Amor. Porque quem lá vai quererá voltar, porque há locais que nos marcam os sonhos e a vontade de simplesmente ... estar... 








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Wednesday, October 05, 2022

Guerlain, O sentido do Olfato, uma história de Aromas
October 05, 20220 Comments



Dispensando artifícios, não se pretende uma exaustão na descrição de como a história desta marca começou, mas sim, enaltecer a evolução dos cheiros, fragrâncias tão especiais, até às mais recentes coleções. Porque a Guerlain, mais do que uma marca de luxo, é uma aventura sensorial, que nos faz viajar até ao Extremo Oriente, Índia, ou simplesmente aos campos perdidos em flores do sul da França. 

Fundada em 1828 em Paris por Pierre Guerlain, médico e químico, numa das, já então, zonas mais nobres, veio a tornar-se em uma das principais marcas internacionais ao longo dos seus 190 anos. Não será necessário explicar que Pierre Guerlain cresceu não apenas pela sua imensa capacidade enquanto perfumista, usando elementos únicos, como por também se ter tornado num dos mais influentes perfumistas das cortes europeias. Pierre não só começou a produzir as suas próprias fragrâncias originais, como também se estabeleceu como perfumista oficial da Rainha da Bélgica. E ao converter os frascos mais simples em obras de arte francesa, usando os conhecimentos dos vidreiros da casa Pochet du Courval, para criar aquela que viria a ser a imagem e assinatura da própria Guerlain, com símbolos nacionais franceses, e o desenho de abelhas, qual bordado vivo em vidro, tornou-se igualmente um exemplo de como a Arte e o Design, se podem complementar totalmente à arte de criar perfumes. 

Sob este signo de luz e Natureza, a Guerlain passa por uma evolução clara e a passo firme, através da família que lhe deu vida. Depois de Pierre, foram Gabriel e Aimé, seus filhos, que assumiram a gestão e controlo da empresa, numa sucessão natural familiar, tal como se torna a utilização de elementos cada vez mais naturais para as novas criações. 

Não falamos apenas de fragrâncias femininas. A Guerlain estabelece-se e afirma-se também como um nome de aromas masculinos e Orientais. Ao mesmo tempo vai ousando e experimentando outras áreas. Apanhando os pigmentos em tons ocre para os seus primeiros produtos de maquilhagem, cria o nome que se torna numa referência na cosmética, Terracotta. 

Hoje, continuamos a reconhecer a marca Guerlain como um símbolo de beleza mundial, caracterizando-se pelos novos padrões que a sociedade exige, a sustentabilidade, a proteção ambiental, mas claro, também pela sua capacidade de reinvenção, com novos tratamentos e cuidados de pele e rosto, estudos de regeneração celular e, principalmente, a exclusividade. 

Aqua Allegoria, lançada em Maio de 2022 é um desses exemplos. Uma seleção de quase 10 fragrâncias para cada tipo de mulher, tornando cada uma única, especial e original. Aromas florais, notas de frutadas e madeiradas, numa explosão e tributo à Natureza que cada vez mais se torna parte indistinguível da própria marca. 

Contudo, sempre lembrando também as suas raízes, o amor e a relação às Artes, surge agora L'art & La Matière. Uma coleção ainda mais singular, onde o recurso a especiarias, cereais, incorporação de grãos torrados de café, madeiras, com intensidades fortes, se torna perfeita para esta nova época do ano.


Dos perfumes e colónias intemporais, únicas, aos tons ocre a rosas vivos e vermelhos hipnóticos, pequenas pérolas "meteóricas" cor de pêssego ou angelicais, aos detalhes da personalização dos frascos imperiais, a Guerlain é definitivamente uma marca de luxo, onde cada objeto adquirido faz parte da própria História de Arte. Onde cada um de nós. se torna guardião de objetos únicos e exclusivos. 


 

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Saturday, September 03, 2022

Covi-Lã
September 03, 20220 Comments


Foto de Jorge Vieira
Arte Urbana de REGG

O Turismo pela Lã

Fábricas e Museus. Unidades industriais e empresas a laborar. 365 dias por ano, numa procura em dinamizar e promover os produtos de origem nacional, numa rede dedicada ao Turismo Industrial. 

Nesta premissa, as pessoas, as terras e as fábricas contam a História do nosso país, muitas vezes relacionadas com episódios políticos que transformaram a vida dos seus protagonistas.

Por outro lado, hoje em dia, as fábricas que ainda resistem à galopante globalização, lutando por manter trabalhadores e garantir justiça salarial, mostram-se também cada vez mais focadas num compromisso com o meio ambiente, procurando soluções sustentáveis onde a Economia Circular e Reciclagem se tornem mais do que apenas meras palavras. 

Nesta passagem de saberes e tradição, de norte a sul de Portugal, teria de caber obrigatoriamente aquela que foi a maior fonte de rendimento às famílias serranas da Covilhã durante os séculos XV e XVI, prolongando-se até ao século XX - a indústria de lanifícios. Um património ainda hoje vivo e que reflete a modernidade que acompanha a necessidade e demanda de clientes igualmente mais exigentes. Mantendo a qualidade, mas olhando para o bem da comunidade e do espaço onde se insere. 

Integrado num conjunto museológico, recuperaram-se a Real Fábrica de Panos, inaugurada em 1764 (onde se encontram as tinturarias e onde atualmente se encontra sediado o Museu de Lanifícios da Universidade da Beira Interior), a Real Fábrica Veiga, cuja abertura ocorreu em 1784 (dedicada à fiação) e ainda a Fábrica Campos Melo e a Fábrica Velha, todas impulsionadas e fundadas por cristãos-novos, tornando a cidade da Covilhã num dos maiores centros industriais do país, logo a seguir do Porto e de Lisboa. De forma irónica, entre 1700 e 1755, por via da Inquisição, muitos destes financiadores foram presos, acusados de judaísmo; mais uma revanche pela presença de grandes comunidades judaicas da região serrana e fronteiriça, mas principalmente pela sua clara importância e influência nos negócios e decisões da Monarquia e Estado, desde a época da Expansão Marítima. 

Contudo, com as transformações impostas pelo Marquês de Pombal, o crescimento da indústria tornou-se mais notório e nem mesmo a Revolução Industrial já no século XIX fez oscilar a sua grandiosidade. Numa época em que as grandes máquinas trabalhavam com energia a vapor, a fábrica António Pessoa de Amorim constrói as primeiras rodas hidráulicas - convém não esquecer que grande parte da indústria se localizava juntos dos principais cursos de água que descem da Serra da Estrela. A energia hidráulica ganha assim a corrida e torna-se um exemplo na engenharia e tecnologia nacionais.

Já durante o século XX, os eventos bélicos e a política nacional, acabam por transformar as vidas, as necessidades e a economia do país, levando também ao um decair na produção. Ainda assim a Covilhã consegue manter-se e torna-se hoje um destino para designers nacionais e internacionais que procuram os melhores materiais e o melhor fabrico, garantindo não apenas o conhecimento da origem dos produtos ao cliente final como proporciona uma retoma de atividade económica e manutenção de postos de trabalho. 


Lã Ecológica

Na sequência de um maior compromisso ambiental, característicos dos tempos que atravessamos, e tendo em consideração que a indústria têxtil é das mais poluentes aos ecossistemas aquáticos e marinhos (ciclo hidrológico), algumas empresas já apresentam igualmente respostas adequadas ao tratamento dos seus resíduos. No que concerna a água, são usadas estações de tratamento  que possibilitam a reutilização do recurso novamente para a operação de fabrico de tecidos. Por outro lado, também já começam a haver linhas de fiação cuja produção provém a 100% do desperdício têxtil (fios, tecidos e malhas vários, restos de rolos). É disto exemplo a fábrica J Gomes, também localizada na Covilhã. Neste polo, recolhem-se e separaram-se os desperdícios, por qualidade de peças e cores. Desta forma, deixa de ser preciso tingir os fios para as tonalidades definidas e pretendidas. Após o processo de reciclagem, inicia-se a transformação das fibras recicladas ou virgens em fios que podem ser aplicados em inúmeros produtos, quais como luvas, cachecóis, meias, mantas. Nestas circunstâncias a empresa são usa corantes nem produtos químicos sintéticos e não existe desperdício de água, tal como os plásticos e cartonagem associados são recolhidos e seguem diretamente para centros de reciclagem. Após ter sofrido uma paragem temporária devido a um grande incêndio já no Inverno passado, a J Gomes, pauta-se por ser então, desde os anos 70, um exemplo a seguir no caminho para a sustentabilidade industrial.


Turismo Industrial e o caminho a seguir

Lanifícios, azeite, vinho, passando pela extração de sal e outros recursos, a reabilitação de zonas mineiras para transformação em zonas e espaços educacionais, os Geoparques (UNESCO), as rotas turísticas portuguesas, incluindo o turismo religioso, são alguns dos exemplos do que pode ser feito de melhor em Portugal no que diz respeito ao Turismo. Verificou-se pelas piores circunstâncias que a subsistência apenas relacionada com sol e praia, não é resposta, ou pelo menos, não será a única resposta a um desafio económico indispensável ao nosso país. Falamos de Portugal continental e também das Regiões Autónomas, que possuem igualmente um imenso potencial, muito além do típico turismo relacionado com a Natureza. Na mesma proporção, é preciso ter consciência que o próprio turismo deixa inegavelmente uma forte pegada ecológica (e que com isso haverá pegada em carbono) e há que se fazer trabalhos de acompanhamento de forma a mitigar seriamente estas situações. Por outro lado, é igualmente necessário um maior compromisso no que toca à recuperação das infraestruturas há muito abandonadas, mas que podem e devem integrar os guias de Turismo Industrial, não apenas por uma questão histórica, mas também por uma questão de manutenção da memória coletiva das cidades e vilas, que têm o seu crescimento (para o melhor e pior) invariavelmente ligados aos movimentos fabris. 

No final do dia, o Turismo Industrial é bem mais do que passear e conhecer a nossa história e arqueologia industrial. É acima do mais, caminhar pela construção e evolução das cidades que levaram também à construção económica do nosso país.

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